Foto 4 - Matheus Guerra

AVIAÇÃO AGRÍCOLA: UMA PERSPECTIVA AMBIENTAL E ECONÔMICA

O PRESENTE TRABALHO FOI PREMIADO COM MENÇÃO HONROSA NO CONGRESSO CIENTÍFICO DA AVIAÇÃO AGRÍCOLA 2021, OCORRIDO DENTRO DA PROGRAMAÇÃO DO CONGRESSO DA AVIAÇÃO AGRÍCOLA DO BRASIL, REALIZADO VIA WEB ENTRE 20 E 22 DE AGOSTO. A DISPUTA ENTRE AS PESQUISAS ACADÊMICAS E TÉCNICAS REUNIU OITO PARTICIPANTES E TODOS PUDERAM APRESENTAR SEUS TRABALHOS NO ENCONTRO AEROAGRÍCOLA. A AVALIAÇÃO FICOU A CARGO DO CONSELHO CIENTÍFICO FORMADO POR DOUTORES E ESPECIALISTAS EM AGRONOMIA E VETERINÁRIA, ALÉM DOS PRESIDENTES DO SINDAG E DO IBRAVAG, COM PREMIAÇÃO PARA AS TRÊS MELHORES PESQUISAS E PARA A MENÇÃO HONROSA POR INOVAÇÃO.

Publicado em: 05/05/22, 
às 16:28
, por IBRAVAG

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(Agricultural Aviation: An Enviromental and Economical Perspective)

Autor
Matheus Vinícius Souza Guerra de Almeida
Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal da Bahia – UFBA. E-mail: ten.matheus.guerra@gmail.com

Atualmente há uma linha de pensamento antagônica à utilização de aeronaves para pulverização de produtos agrários ou de prevenção aos incêndios que parte do pressuposto da proteção ao meio ambiente. Transitam nas câmaras legislativas de diversos estados e prefeituras, 18 projetos de lei voltados à proibição da pulverização aérea, essa linha de pensamento é disseminada entre políticos e inclusive alguns acadêmicos pouco familiarizados com o setor. Utilizando uma instrumentalização da economia neoclássica, o presente trabalho visa a desmistificar esta ótica enviesada sobre a pulverização aérea e demonstrar, através de resultados comparativos, obtidos na prática, o quanto a aviação agrícola performa na redução dos impactos ambientais. Seja na eficiência de redução dos focos de incêndio preservando fauna e flora; seja na redução de emissão de poluentes através da mitigação do uso de máquinas no campo em grande número e na precisão de dispersão dos produtos sobre a área, trazendo um aumento de produtividade em relação a outras técnicas.

Regulamentada pela ANAC como SAE (Serviço Aéreo Especializado), bem como pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Portaria nº 1019/GM5, de 1980, do Ministério da Aeronáutica e Instrução Normativa nº36 do Ministério do Meio Ambiente; a atividade aérea de pulverização agrícola já completa 100 anos de desenvolvimento tecnológico e 60 anos de regulamentação no Brasil, e, se estende além da aplicação de defensivos agrícolas, podendo atuar desde o plantio de sementes até o combate a incêndios. Muito mais que dispersar “veneno” como dito popularmente, esta atividade possui impactos e externalidades que vão além do conceito preestabelecido e das fake news. O setor possui uma comissão especial dentro do Ministério da Agricultura, que anualmente discute melhores práticas, políticas e inovações para serem regulamentadas e aprovadas.

Em grandes áreas de plantio, o trabalho exige a aplicação de técnicas e máquinas que possam otimizar e garantir a execução dos projetos de produção agrícola em um determinado período de tempo. Ocorrem demandas de manejo a cada etapa de uma safra e são utilizados produtos de diversas ordens, desde a correção de solo até o controle de pragas e a colheita, e cada uma dessas etapas recebe um receituário de aplicação emitido para o dia dessa aplicação, considerando a meteorologia presente dentre outros fatores e variáveis, no intuito de garantir a maior produção, com a melhor qualidade, no menor espaço de tempo. No que tange à atividade de pulverização aérea, o emprego de aeronaves implica em maior produtividade da cultura em comparação à mesma área tratada por tratores em condições semelhantes, utilizando os mesmos produtos, podendo ainda representar menor agressão ao ambiente por utilizar menor volume de calda e por compensar eficientemente variáveis recorrentes na aplicação como a deriva provocada pelo vento atuante. Cabe ao produtor escolher quais máquinas e técnicas serão empregadas no seu projeto de produção, o que será determinado em função da cultura utilizada na safra e da área trabalhada. Cada cultura possui um esquema de trabalho organizado em um cronograma de manejo que se divide em etapas e essa classificação nos permite quantificar a quantidade de trabalho, o tempo gasto e o volume de produto aplicado em determinado local, levando em consideração o relevo do solo na área de aplicação. Feito isso, basta escolher a ferramenta em função do custo-benefício.

Podemos observar o ponto em que ainda se trata de um processo ergódico onde as variáveis são definidas pelas políticas de seus agentes, ora o produtor pode optar por técnicas convencionais e maior tempo de manejo manual, ora pode realizar o manejo com máquinas rurais que irão otimizar e reduzir o tempo de trabalho por hectare permitindo a produção de uma mesma cultura em maiores áreas numa safra (o que inclusive pode permitir linhas de financiamento que não estariam disponíveis). Esses produtores ainda têm que lidar com a regulamentação e fiscalização do que pode ou não ser utilizado durante a safra. Nesse ponto, o governo entra como um agente através de organizações de diversas ordens controlando os impactos dessa atividade por meio de políticas ambientais e econômicas.

Cartazes sobre proibição da pulverização aérea contribuem para disseminar uma imagem errônea sobre a aviação agrícola, esquecendo as inovações tecnológicas e de gestão que tornam a pulverização aérea segura em termos ambientais e eficiente em termos de produção. (Clique para ampliar)

Através da perspectiva em que esses produtores fazem parte de uma cadeia de abastecimento, onde a demanda de mercado determina o que será produzido, a tomada de decisão no tocante ao manejo dos projetos desses agentes será condicionada pelas preferências do mercado consumidor relativas ao seu produto como no caso dos alimentos orgânicos, onde não se admite a utilização de sementes transgênicas, agrodefensivos ou herbicidas. Nesse processo, determinados herbicidas, agrodefensivos e adubos podem ter um impacto negativo sobre o valor do produto e sobre um determinado bioma que esteja ao redor da área de aplicação, rios, nascentes, lençóis freáticos, fauna, flora e inclusive comunidades e plantações circunvizinhas. Com esses impactos se estendendo ainda à forma e quantidade de descarte das embalagens vetores desses produtos, que pode gerar proporções fora do ambiente agrícola e alcançar repercussões alheias ao controle de seus agentes fora do âmbito de fiscalização. Logicamente, os efeitos adversos serão proporcionais à quantidade de aplicações necessárias e o volume de produto aplicado durante o tratamento da área, nesse quesito, o rigor no cumprimento de normas e o emprego de aeronaves associadas às práticas e técnicas modernas de geolocalização permitem uma aplicação em altura ideal para pulverização e uniformidade da gota, com ganho de eficiência e redução da vazão de calda aplicada por hectare em comparação às tecnologias terrestres.

Diante desse frame, nos deparamos com um Wicked Problem (RITTEL & WEBBER, 1973) ambiental e econômico que atualmente tenta ser domado através de políticas e regulamentações associadas às técnicas de manejo em larga escala mais modernas e que permitem uma maior segurança de longo prazo nos projetos seja no quesito legal, ambiental, ou mesmo econômico, pois a extensão dos danos não se limita apenas a terceiros circunvizinhos, mas inclusive ao próprio produtor que encara um trade-off ao lançar mão da utilização de substâncias ou culturas que irão afetar a longevidade do solo e sua atuação no mercado. Ilustrando essa face do problema, recentemente, a maior rede de produtos orgânicos da Escandinávia suspendeu a compra de alimentos do Brasil, após o lançamento do Atlas “Geografia e Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia”, em abril de 2017. É nesse quesito que surge a não ergodicidade do problema e, portanto, os riscos e incertezas, pois há a mudança constante de paradigmas. Ora, há 50 anos, as políticas ambientais não continham o peso social e as demandas que surgiram, bem como a fiscalização e legislação também tinham outro formato nessa época, ou seja, não apenas o mundo está em constante mudança, mas também nossa estrutura social e o comportamento dos seres humanos.

De acordo com Douglas North (1999), contribui para essa não ergodicidade a ausência de meios para quantificar o quanto essas ações repercutem fisicamente em termos de danos ao meio ambiente e ao solo, trazendo uma dificuldade em medir as consequências e riscos envolvidos nas práticas agrárias. Uma vez que não é possível medir esses efeitos, não podemos prever as consequências, então é necessário estruturar o problema de maneira que suas variáveis possam ser observadas, transformando a incerteza em risco calculado. Ainda é necessário entender que a natureza do mundo em constante mudança implica em soluções diferentes para um mesmo problema em tempos diferentes. Muitas vezes, a solução pode implicar em uma reestruturação das relações desse mercado objeto de estudo. Um importante quesito dessa estruturação da produtividade está na escolha das técnicas e máquinas de manejo. Desde a revolução industrial, os tratores sempre tiveram destaque no manejo dos cultivos e no processo de produção de alimentos, e como todo meio de transporte e produção possui suas externalidades positivas e negativas. Entre os pontos positivos estão a substituição dos meios de manejo manual ou por tração animal, baixo custo de manutenção e possibilidade de utilização mais independente da meteorologia, porém traz desvantagens comparativamente à aplicação aérea como o pisoteio do cultivo, a baixa precisão, maior vazão necessária por hectare e menor área coberta em um dia de trabalho.

EquipamentoVazãoVelocidadeFaixaÁreaTempo
EMB-20220l/ha191km/h19,3m14ha2 min
JD 4730100l/ha14km/h30m14ha20 min
Tabela 1. Dados comparativos entre aplicação aérea e terrestre. Uma análise de eficiência.

Comparativamente, uma aeronave do modelo Ipanema EMB-202, capaz de transportar até 700 litros de calda e de aplicar até 600ha por dia, com maior uniformidade de gota e precisão na faixa de deposição, enquanto um trator tem a capacidade de cobrir apenas 25ha/dia utilizando maior vazão de calda, mais próxima ao solo e com menor uniformidade de gotas. Ou seja, a aplicação aérea chega a cobrir 25 vezes mais área no mesmo espaço de tempo. Outro exemplo comparativo seriam os modelos AT-301 e AT-402 da Air Tractor, que, apesar de representarem modelos de menor versão de sua linha de produção, têm a capacidade de realizar o trabalho de pelo menos 35 tratores de aplicação terrestre, sob as mesmas condições climáticas e utilizando a mesma calda.

Além de possuir um menor tamanho de gota e menor amplitude relativa, proporcionando melhor penetração e eficiência do produto, a aplicação aérea ainda utiliza até 10 vezes menos água potável do que qualquer outro tipo de aplicação e, após a lida, todas as aeronaves são encaminhadas a um pátio específico para descontaminação, exigência que consta na instrução normativa Nº 02 do Ministério da Agricultura. Essa aplicação ocorre sem contato com o solo, ignorando desníveis do solo e proporcionando uma distribuição ideal do produto, mantendo velocidade, altura e vazão constantes obtendo então uma faixa de deposição monitorada através do sistema de DGPS que alimenta as informações do mapa de aplicação em tempo real, possibilitando a correção de deriva e indicando possíveis falhas, evitando que uma mesma área receba mais de uma aplicação inadvertidamente.

Por legislação específica, todas as empresas do setor possuem um engenheiro agrônomo coordenador da operação, um técnico agrícola executor por aeronave e um piloto sempre com experiência acima de 400 horas de voo e habilitação específica de aviação agrícola. Todas as operações de pulverização aérea são registradas, baseadas em coordenadas geográficas com precisão métrica, podendo fornecer mapas de aplicação e relatórios completos; que por instrução normativa do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), são enviados mensalmente. Como a aeronave não toca no solo durante o manejo, não ocorre o pisoteio do plantio, que pode representar uma perda de 4% a 7% na produção e redução de até 50% de produtividade por onde passaram as rodas do trator, caracterizando per se um custo muito superior ao da operação de pulverização aérea; inexiste o risco de doenças e de pragas serem levadas de uma lavoura à outra, aumentando a produtividade à medida que lida com as pragas em menor espaço de tempo, com menor número de aplicações e menor volume de calda utilizado por hectare. Apesar do maior custo de manutenção, esse serviço aéreo especializado tem a vantagem de produzir externalidades positivas, associando um menor impacto ambiental através do aumento de eficiência e redução da carga química utilizada por hectare, a um aumento de produtividade pelo controle mais efetivo de doenças e pragas e o não pisoteio do plantio. A Pulverização Aérea surge nesse contexto como uma ferramenta que associa eficiência à redução de custos ambientais, redução do tempo de manejo, redução da quantidade de maquinário e equipes de solo (mitigando a probabilidade de acidentes), redução de volume do produto aplicado por área e ainda um menor volume de emissões de dióxido de carbono.

MISSÃO: Matheus Guerra em voo solo, fazendo aerolevantamento de dados e georreferenciamento de pontos de manejo de lavouras por meio de DGPS.
Foto: Arquivo pessoal

Ainda cabe ressaltar na análise do direito de uso da propriedade sob a ótica de Coase (1960) que a prática de pulverização aérea permite menores limites de distanciamento urbano e de APAs, a partir do momento que reduz o volume de calda aplicada por hectare, a uma menor vazão e com correção dos efeitos de deriva, e consequentemente ocasiona em redução dos efeitos colaterais e poluição de áreas circunvizinhas ao compensar os efeitos de deriva. Nesse contexto, a utilização do sistema DGPS em substituição ao balizamento terrestre com estacas para a determinação das faixas de aplicação, levam o controle dessa variável a outro nível a partir do momento que é possível mapear em tempo real todas as etapas de aplicação, quantificar e determinar o produto efetivamente aplicado em função de seu posicionamento geográfico, permitindo o acompanhamento da produtividade e das externalidades envolvidas em cada tipo de manejo.

A partir da análise detalhada e comparativa das variáveis envolvidas nos sistemas ecossociais, percebemos que através da pulverização aérea e das operações de combate à incêndios obtemos um espectro mitigador de danos em relação às técnicas tradicionais de manejo do cultivo e de combate às chamas. É inegável a contribuição do emprego de aeronaves enquanto vetor tecnológico de aumento de produtividade e redução dos impactos ambientais em diversos contextos. Qualquer viés de proibição da atividade aérea passa a ser contrário aos interesses de preservação do meio ambiente, ao passo que desconhece uma ferramenta de redução dos impactos associados à utilização de produtos no controle de pragas ou mesmo de chamas. Observa-se que o discurso político por trás da proibição das atividades aéreas de aviação agrícola, além de contraditório, nega os próprios princípios aos quais visa “zelar” tanto no âmbito social quanto na temática ambiental e política. Em dado momento, esse discurso levado ao extremo pode, inclusive, ir de encontro aos interesses fundamentais dos seus próprios apoiadores, como o direito à alimentação e o direito à vida.

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