Em apenas 60 dias, a aviação agrícola brasileira já havia lançado pelo menos 15,8 milhões de litros de água contra focos de incêndios no Pantanal (MT e MS), São Paulo e Goiás. Em operações que envolveram cerca de 30 aeronaves atuando para órgãos oficiais e produtores rurais. Os números são parciais. O levantamento é do final de agosto e será concluído depois que a temporada de incêndios terminar, que segue pelo menos até o final de setembro – podendo entrar em outubro.
Desse total, 14,38 milhões de litros de água já haviam sido lançados contra incêndios no Pantanal (no MT e MS), por 17 aeronaves – contratadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e pelos governos do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Nesse caso, no apoio aos mais de 200 brigadistas e bombeiros que fazem o combate em solo.
ESTADOS
Em São Paulo, outros pelo menos 11 aviões agrícolas somaram cerca de 760 mil litros de água empregados no combate a incêndios em lavouras e áreas de preservação. Especialmente contra os focos registrados no final da última semana de agosto em várias partes do Estado. As aeronaves foram acionadas tanto pelo governo do Estado quanto por usinas.
Isso tudo, além das brigadas aéreas de combate a incêndio mantidas por empresas aeroagrícolas de Goiás. Onde cerca de 540 mil litros já foram lançados contra chamas em lavouras (especialmente áreas de palhada de milho) e reservas ambientais nas propriedades. As operações envolveram 15 aviões.
Na prática, o número final deve ficar bem maior, já que (desde o começo dessa conta inicial), o Sindag já relacionou cerca de 50 empresas de aviação agrícola operando contra chamas nesta temporada no País. Inclusive na Amazônia e outros Estados que não haviam aparecido no levantamento primário.
A última vez que o Sindag fez esse levantamento foi sobre as operações de 2021. Naquele ano, empresas de aviação agrícola em todo o País haviam somado 10,9 mil lançamentos de água, somando 19,5 milhões de litros em 4 mil horas totalizadas em voos contra incêndios.
Apoio às equipes que fazem o combate em solo
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Com o auxílio de aviões, brigadistas do Prevfogo/Ibama combatem incêndios florestais no Pantanal.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Nas operações aéreas contra chamas, cerca de 90% do trabalho é feito em parceria com brigadistas em solo. Com o líder da equipe em terra solicitando apoio aéreo e coordenando com o piloto como é feito o lançamento. Em grandes incêndios, a função do avião normalmente é reduzir o fogo para que os brigadistas possam chegar aos focos em segurança. Isso porque é o pessoal em terra que elimina totalmente as chamas e ainda faz o “trabalho cirúrgico” contra braseiros – que, se não extintos, podem reacender a linha de incêndio.
Aviões agrícolas operam sozinhos quando os focos estão em áreas de difícil acesso, como encostas ou terrenos acidentados. Quando há urgência de fazer um corredor de fuga para a fauna cercada pelas chamas ou quando não há equipe perto e é preciso segurar ou tentar eliminar a linha de fogo com mais lançamentos de água. Neste caso, por exemplo, em fazendas com fogo perto das casas ou instalações.
O modelo de operação com aviões e brigadistas é adotado internacionalmente. Há mais de três décadas é empregado em reservas naturais brasileiras e, mais tarde, passou a ser usado também em lavouras (junto com brigadistas de fazendas e usinas). Lembrando que a aviação agrícola opera em reservas federais em parceria com equipes do ICMBio desde a criação do órgão, em 2007.
Antes disso, já operava desde os anos 1990 com as equipes do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e (nos Estados) com bombeiros. Para completar, desde os anos 1960 o combate a incêndios em campos e florestas está entre as prerrogativas do setor aeroagrícola. Em 2022, o País ganhou uma Lei Federal incluindo os aviões agrícolas na políticas de governo para o combate aos incêndios florestais.
Expertise brasileira com reconhecimento internacional
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Testes realizados em 2022 ajudaram a aprimorar os protocolos de combate a incêndio para cada tipo de aeronave agrícola
Atualmente, além de já contar com cursos próprios para o aprimoramento de pilotos agrícolas que pretendem atuar contra as chamas, o setor no Brasil também já se tornou reconhecido internacionalmente pela capacidade de seu pessoal. Exportando ambos. No caso dos pilotos agrícolas, este ano seis profissionais daqui seguem atuando contra as chamas na Argélia.
Eles foram contratados por uma empresa argentina que, por sua vez, foi contratada pelo governo argelino – para uma força-tarefa que abrange também aeronaves do Chile e Canadá. Segundo os profissionais, lá a situação é ainda mais dramática do que no Brasil, do ponto de vista humanitário. Com inúmeras vilas isoladas em pontos elevados no meio das chamas, mais de 160 pessoas morreram em incêndios florestais ocorridos entre 2021 e 2023. Isso em ondas de secura e calor que têm afetado todo o Mediterrâneo nos últimos anos.
Enquanto isso, a África já conta também com tecnologia embarcada brasileira nas operações contra as chamas. A solução desenvolvida pela empresa paranaense Zanoni Equipamentos, que, além das aeroagrícolas naquele continente, tem suas comportas de incêndio (por onde o avião lança a água ou retardante) instaladas em aeronaves da Argentina e, claro, também no Brasil.
COMPORTAS
Aliás, do lado de cá do Atlântico, a Zanoni promoveu em 2022 os testes para gerar o primeiro protocolo de avaliação da eficiência de combate a incêndio com aeronaves agrícolas no Brasil. A movimentação foi em São José do Rio Preto, no interior paulista, e contou com aeronaves de diversos modelos, cedidas por quatro empresas aeroagrícolas. As avaliações ficaram a cargo da Sabri – Sabedoria Agrícola (especializada em avaliação, calibração e regulagem de equipamentos embarcados) e RTC – Gestão de Riscos e Treinamentos (focada em diagnóstico, treinamento e implantação de estratégias, ferramentas e sistemas de prevenção e combate a incêndios).
O trabalho inédito no Brasil avaliou o desempenho de seis modelos de aeronaves agrícolas: o Ipanema 202, fabricado pela Embraer; os modelos AT 402, 502, 602 e 802, da fabricante norte-americana Air Tractor, e o Thrush 510, da Thrush Aircraft (também dos Estados Unidos) – com capacidades entre 950 e 3,1 mil litros de água. Os seis aviões efetuaram lançamentos em uma faixa de terreno com milhares de estacas com recipientes para medir a água que chegou em cada ponto. O foco do teste foi definir a melhor estratégia de combate e cenário para cada tipo de aeronave.