A China entrou 2021 com cerca de 100 mil drones agrícolas operando em seu território, atingindo 53,3 milhões de hectares pulverizados em lavouras. Isso em 135 milhões de hectares cultiváveis do país, segundo o Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (Fao). A estimativa foi apresentada no final de dezembro, pelo diretor do Centro Internacional de Pesquisa em Tecnologia de Precisão em Aplicações por Aviação Agrícola, Lan Yubin – da Universidade Agrícola do Sul da China. Isso durante a Conferência Anual da entidade, em Guangzhou, na província de Guangdong
Já do lado de cá do planeta, o Brasil começou o ano com 1.492 drones de uso agrícola, entre os 79.673 aparelhos de uso geral cadastrados o Sistema de Aeronaves Não Tripuladas (Sisant), da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O que dá uma ideia do quanto o setor pode crescer, considerando a diversidade e a potência da agricultura brasileira – em seus quase 66 milhões de hectares de lavouras, segundo a Embrapa, ou 64 milhões de hectares, segundo a Nasa.
NICHOS E CENÁRIOS
Enquanto na Ásia os aparelhos remotos estão entrando como principal tecnologia para agricultores que até então plantavam e aplicavam defensivos praticamente à mão, por aqui eles ocupam o nicho de complemento de tecnologias maiores. Principalmente as aeronaves, onde o Brasil tem a segunda maior frota do mundo, com cerca de 2,3 mil aviões e helicópteros. Com os drones, por exemplo, fazendo arremates próximo a áreas ambientalmente sensíveis ou em aplicações em pequenos pontos em áreas maiores. Além disso, os também chamados veículos remotamente tripulados tendem a substituir equipamentos costais e incrementar a tecnologia em áreas menores. Mas, em nosso País, sempre na carona de uma agricultura já bastante tecnificada.
A exemplo do que ocorre em outras partes do mundo, como nos Estados Unidos e Europa, por aqui o setor de drones também enxerga um horizonte amplo em culturas de alto valor agregado. Principalmente vinhedos, onde a questão não é só facilitar a aplicação em áreas pequenas, mas também agregar a ferramenta à chamada agricultura 4.0.
Mas há ainda outro extremo, ainda controverso entre os próprios fabricantes de drones: fundir, literalmente, a tecnologia de drones com a aviação agrícola convencional. Neste caso, a partir de algo que ocorre em terras norte-americanas e no Oriente Médio, com uma empresa que optou por transformar aeronaves tripuladas em aparelhos remotos.
Brasil deve ganhar regulação específica neste semestre
Paralelo às conjecturas mercadológicas, o Brasil se prepara para ter publicada, ainda neste semestre, uma regulamentação específica para drones de pulverização em lavouras. A chamada Instrução Normativa (IN) dos Drones começou a ser construída ainda em 2018, no âmbito do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Isso com a participação, desde então, do Sindag e do Instituto Brasileiro da Aviação Agrícola (Ibravag), além de representantes da indústria dos chamados veículos aéreos não tripulados (vants) – ou aeronaves remotamente tripuladas (RPAs, na sigla em inglês), como a ferramenta é referida no projeto do Mapa.
A demanda surgiu a partir da necessidade de enquadrar a nova tecnologia na legislação sobre pulverizações aéreas – cuja fiscalização é atribuição direta do Ministério. O resultado de toda essa articulação foi o texto provisório que esteve em consulta pública entre julho e setembro de 2020.
Segundo chefe da Divisão de Aviação Agrícola (DAA) do Mapa, Uéllen Lisoski Duarte Colatto, durante a consulta o Ministério ainda recebeu mais de 130 contribuições ao texto, feitas pelo Sindag e por diversas entidades ou pessoas físicas via o link da consulta. Terminado o processo, todas foram avaliadas pelos técnicos da instituição, que consolidaram uma nova versão da proposta. “A avaliação da consulta pública foi finalizada em dezembro e o texto reformulado foi para a Coordenação Geral de Agrotóxico e Afins. A próxima etapa envolve a avaliação da Consultoria Jurídica do Mapa.” Segundo Uélen, a expectativa é de que em abril se possa ter a Instrução Normativa publicada.
Basicamente, a proposta de IN dos Drones abrange aparelhos em duas das três classes previstas pelas regras da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) – onde os veículos remotos são regulados desde 2017, para uso geral: Classe 2 (de 25 a até 150 quilos de peso total) e Classe 3 (até 25 quilos de peso total). Os aparelhos de mais de 150 quilos deverão seguir as mesmas regras dos aviões agrícolas.
De antemão, ficaram praticamente sacramentados no rascunho da Instrução Normativa itens como a exigência de curso específico (homologado pelo Mapa) para os pilotos de drones agrícolas e a obrigatoriedade de elaboração de relatórios operacionais de suas missões em campo – exigência que vale desde 1989 para a aviação agrícola (única ferramenta para o trato de lavouras com esse nível de transparência).
Envelhecimento levou a China a deixar aviação convencional em segundo plano
A China teve suas primeiras operações aeroagrícolas em 1951, também com aviões adaptados e, mais tarde, alguns aparelhos importados. Mas só nos anos 80 resolveu investir em um projeto próprio: o Hongdu N-5. O avião teve seu primeiro voo em dezembro de 1989 e entrou em produção em 1992. Porém, em 2008 ainda eram apenas 200 aparelhos em operação. Segundo levantamento feito pelo Sindag em 2018, na época a frota aeroagrícola chinesa tinha apenas cerca de 500 aeronaves. Isso apesar de uma demanda de pelo menos 4,5 mil aparelhos, admitida pelo próprio governo local.
Nesse cenário, a opção de uma política por aparelhos remotos nos Planos Quinquenais da China* veio na urgência e dar suporte a uma massa de agricultores cada vez menor e mais idosa. Segundo o governo chinês, entre 2007 e 2017, a população rural diminuiu 17,4%, enquanto a população total de idosos no campo aumentou em 47,9%. Ou seja, menos gente podendo entrar na lavoura para semear artesanalmente ou carregar um pulverizador costal durante boa parte do dia.
Desde então, a aquisição e drones conta com subsídios dos governos central e das províncias. Atitude que busca, de quebra, incentivar os mais jovens a permanecerem ou voltarem para as lavouras. Segundo o estudo da Consultoria Ipsos, enquanto um agricultor com pulverizador costal consegue abranger no máximo 0,1 hectare por hora, no mesmo tempo o drone consegue cobrir até 13 hectares.
Com cerca de 1,4 bilhão de habitantes, a China tem uma economia de US$ 12 trilhões e sua área cultivável representa pouco mais de 7% das terras agricultáveis do planeta. Ainda assim, o país tem que produzir comida para cerca de 20% da população mundial.
(*) A República Popular da China tem uma forma de governo socialista e, apesar de comandada por um presidente, é dirigida pelo Partido Socialista Chinês (única sigla do país). Suas diretrizes são definidas ou reavaliadas a cada cinco anos, gerando os Planos Quinquenais, com estratégias e metas para o período em todas as áreas.
A título de curiosidade, ainda sobre aeronaves tripuladas, a própria aviação geral da China é pequena. O país contava com 3.317 aeronaves em junho de 2019, segundo a Ipsos. Número maior do que anunciado pela agência Xinhua, que em outubro do ano passado apontou 2.913 aeronaves, em 509 companhias. A reportagem da agência trata dos avanços do Plano Quinquenal do governo chinês para 2016-2020 – que comemora incrementos, respectivamente, de 81,1% e 30,3% nesses índices, em relação ao quinquênio anterior.
Subsídios garantem crescimento vertiginoso
Número de drones agrícolas na China cresceu vertiginosamente em pouco tempo. De pouco mais de 6 mil aparelhos em 2016 para 13 mil drones em lavouras em 2017 – graças a programas de subsídios para aquisição e novos negócios, como aluguel e leasing. Segundo a Ipsos, o primeiro programa de subsídio de drones no país foi lançado em 2014, pela província de Henan. O governo local subsidiava 10% do preço de drones de 5 a 9 quilos, 20% do valor de aparelhos de 10 a 34 quilos e 60% do valor de drones de mais de 35 quilos.
Depois, outros programas semelhantes foram surgindo em diversas províncias. Em 2017 o governo central do país também implantou seu plano de apoio, bancando o equivalente (câmbio de fevereiro deste ano), a até R$ 25 mil na compra dos aparelhos com capacidade até 30 litros. O incentivo federal aumentou aos poucos sua abrangência e passou a alcançar todo o País em 2020.
Atualmente, os preços dos drones no país podem variar do equivalente a R$ 10 mil a R$ 110 mil para quadricópteros de pulverização e entre R$ 140 mil a R$ 240 mil para drones maiores, tipo mini helicópteros de pulverização. No caso dos drones para captação e processamento de imagens, os custos variam entre R$ 8,5 mil e R$ 32 mil para multirotores até entre R$ 50 mil a R$ 300 mil para aparelhos de asa fixa.
ESCOLAS
No quesito treinamento, pelas regras da Agência de Aviação Civil da China (CAAC, na sigla em inglês) a operação de aparelhos pesando mais de sete quilos exige licença de piloto de drones da Associação de Proprietários e Pilotos de Aeronaves da China (AOPA-China), sob a supervisão da CAAC. Se o equipamento for agrícola, o piloto se enquadra no nos requisitos da chamada Classe V de Drones Comerciais – Proteção de Cultivo.
Em 2014 eram penas 244 pilotos certificados (entre todas as categorias de aparelhos remotos), formados em 18 centros de treinamento. Em 2019 esse número já tinha pulado para 67.218 licenças válidas de pilotos de drones, conforme a CAAC. Ao mesmo tempo em que chegava a 200 o número de centros de treinamento espalhados pelo país.
FABRICANTES
Sobre as estatísticas industriais, a consultoria Ipsos revela que em 2013 havia 130 fabricantes de drones no país, número que explodiu para 1,2 mil em 2019. Segundo a CAAC, em 2018 eram 285 mil drones registrados no território chinês (para todas as finalidades). Dado que pulou para 339 mil já no ano seguinte.
Só em 2017, a produção de drones na indústria chinesa bateu os 2,5 milhões de unidades (entre todos os segmentos e fornecidos para todo o planeta). Dois anos depois, os aparelhos de uso comercial e governamental (segurança, resgate e emergências) representaram metade da demanda. Nesse bolo, o maior crescimento foi verificado no setor agrícola, seguido do energético (inspeção de linhas).
Entre as principais empresas fornecedoras para o segmento agrícola estão a DJI, XAG, TTA e Walkera, além de outras que atuam apenas na parte de imagens. Só a XAG (especializada em atender pequenos agricultores) tinha em 2019 mais de 42 mil drones realizando em torno de 1,2 milhão de voos todos os dias. Informação divulgada pelo seu próprio cofundador, Justin Gong, em um debate da Revista Fortune.
Não é à toa que hoje o país é responsável pelo fornecimento de mais de 70% dos aparelhos remotos no mercado mundial.
Guangdong busca liderança mundial em pesquisas
Quando se fala em aviação agrícola de precisão, próprio Centro de Pesquisa em Aplicações por Aviação Agrícola – mencionado no início desta reportagem – faz da província de Guangdong (onde está sediado) o principal polo do setor na China. Com a meta de ser reconhecido como liderança mundial no segmento. Para isso, só a área do seu laboratório de túnel de vento para novos drones tem mais de 6 mil metros quadrados. Para completar, a equipe de tecnologias em drones da Universidade do Sul da China conta com cerca de 200 integrantes – 32 professores titulares e o restante doutores e alunos de mestrado. Não por acaso a região também abriga as principais empresa fabricantes de drones no mundo, como a DJI e a Jifei.
LIDERANÇA
“Da fabricação à aplicação, Guangdong está na vanguarda do país. Continuaremos a fortalecer o intercâmbio com parceiros nacionais e estrangeiros para alcançarmos a liderança internacional na aviação agrícola de precisão”, explicou o diretor Lan Yubin em uma entrevista em dezembro à agência de notícias estatal Xinhuanet.
Yubin assumiu o posto de diretor em 2014, retornando a seu país depois de passar pela A & M University, no estado norte-americano do Texas, além das Universidades de Nebraska e da Georgia e ter atuado ainda como professor titular e pesquisador sênior do Serviço de Pesquisas Agrícolas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. Aliás, foi ele quem apresentou para primeira vez, em 2005, o conceito de Aviação Agrícola de Precisão.
O termo se refere ao uso de sensoriamento remoto aéreo para guiar as aplicações de drones ou aeronaves na lavoura. Os dados de fundo e a análise de imagem são usados para obter eficiência e certificação de aplicação de defensivos, para que os agricultores possam aprender sobre as plantações. Ou seja, “a aplicação precisa conforme o surgimento e distribuição de pragas”. Por conta disso, o professor também recebeu em 2018 o título de Acadêmico, da Academia Europeia de Ciências e Artes.
Tecnologia ainda à frente da técnica
Na China, as áreas agrícolas normalmente são pequenas e as aplicações por drones são feitas quase indiscriminadamente. “Em que sentido: aqui temos que avaliar fatores como níveis e dano (da praga na lavoura) e o custo/benefício, por exemplo. Lá não. Se tem um inseto, eles já aplicam”, explica o consultor e pesquisador Henrique Borges Neves Campos, da Sabri – Sabedoria Agrícola, de Ribeirão Preto/SP. Além disso, segundo ele, os produtores locais ainda estão engatinhando em termos de tecnologias de pontas de pulverização e outros itens do arsenal necessário para eficiência nas lavouras.
Doutor em tecnologias de aplicação e com experiência em análises e ajustes de equipamentos em campo em várias partes do mundo (além de uma rotina intensa nessa atividade no País), Henrique conta que viu de perto drones em ação na Tailândia e visitou fazendas também nas Filipinas, onde a ferramenta tem sido usada de forma crescente em lavouras de arroz.
“É um mercado totalmente aberto”, assinala. Enquanto em alguns locais já se usa drones com agilidade, em outros ele viu pessoas plantando soja na mão. “Uma senhora com uma enxada (indo à frente e abrindo pequenas covas) e duas plantando e passando o pé por cima (para tapar os buracos). Tudo em uma área do tamanho de um quarteirão. Era a plantação delas.”
FORMULAÇÕES
Esse cenário já despertou a atenção das indústrias químicas, que estão criando formulações mais inteligentes para usar em um volume de calda tão baixo quanto o drone. “Aplica-se 5, 6, 10 e às vezes 15 litros/hectare.” Isso tudo considerando mercados, por exemplo, de quase 600 milhões de pessoas nas áreas rurais da China e as mais de 700 milhões de pessoas nas áreas rurais de toda a África.
No Brasil, Henrique conta que realizou testes de campo com drones de marcas variadas e se surpreendeu positivamente com os resultados. “Baixos coeficientes de deformação e aplicação uniforme. Desde que voando na altura certa, com a ponta de aplicação certa, a aplicação por drone pode entregar um resultado bem interessante e de maneira bem uniforme.”
Sobre o crescimento do setor, Henrique acredita ser uma tendência. Principalmente a partir da regulamentação dentro do Ministério da Agricultura. “Como o Uber cresceu na informalidade e depois foi regrado, o drone também buscou seu espaço.” Agora, a tendência é de que os próprios empresários aeroagrícolas agreguem a ferramenta a suas frotas. Devido justamente a complementos importante que a ferramenta proporciona ao serviço.
Por exemplo, no combate a plantas daninhas junto à cerca das propriedades. “Essas plantas têm capacidade de gerar de 100 mil a 500 mil sementes, que o vento pode jogar para dentro da plantação. Com o drone aplicando só em cima da cerca já resolve muita coisa.”
Sem falar nas novidades, como o drone para análise de solo, testado em fevereiro no Brasil. O aparelho pousa, recolhe a amostra e georreferencia, repetindo a operação diversas vezes dentro do talhão – quase como as sondas espaciais enviadas a Marte. “Não precisa mais o cara entrar de quadriciclo na área para coletar as amostras”, brinca Henrique. “Faz totalmente sentido usar os drones não só para pulverização. Talvez não vejamos isso, mas os nossos filhos verão avião agrícola decolando sozinho. Não precisa fazer drone de 3 mil litros. O avião já está aí”, completa.
Na verdade, o próprio exemplo citado como futuro pelo consultor também já é realidade.
Surgem os helicópteros “dronizados”
Drones de pulverização do tamanho de aeronaves tripuladas já estão em campo há pelo menos dois anos. Na verdade, o atalho para essa tecnologia chegar ao campo foi juntar as duas coisas: transformar aeronaves tripuladas em aparelhos remotos automáticos.
Desde 2019 a empresa Uavos Holdings Limited, com sede em Hong Kong e escritórios na Califórnia, Espanha e Suíça, vem acrescentando aeronaves convertidas em drones ao seu portifólio de equipamentos aéreos para missões não-tripuladas. Com isso, já são pelo menos três modelos de helicópteros e um avião à disposição do mercado. Isso somado a outros sete drones menores, originalmente desenvolvidos como tal. E já olhando para cá.
“A Uavos vai se expandir para novos mercados e o Brasil é uma das regiões em que estamos extremamente interessados”, adianta a chefe do Departamento de Relações Públicas da empresa, Taisia Vasiukovich. Em conversa com o Sindag, ela lembrou que, de acordo com a Agência de Pesquisa de Mercado de UAV, o setor de drones agrícolas foi avaliado em US$ 9,9 bilhões em 2019, com a perspectiva de crescer 7,1% ao ano (CAGR) entre 2020 e 2025. “A América do Norte e a Europa são os maiores e mais avançados mercados no que diz respeito à adoção de tecnologias inovadoras em agricultura, enquanto a América do Sul apresenta o maior potencial de crescimento neste mercado”, completa Taisia.
Os três helicópteros convertidos em drones da Uavos nasceram inicialmente para missões de ajuda humanitária sob mau tempo e condições de perigo para o piloto, mas se mostraram adequados também para operações aeroagrícolas. Um deles é o R22-UV, baseado no modelo Robinson R-22 (largamente usado no Brasil para funções diversas). O aparelho tem capacidade para 180 quilos de carga. Os outros dois aparelhos sem piloto embarcado são o UVH-500 e o Alpin, ambos com capacidade para 160 quilos de carga e baseados no helicóptero ultraleve ítalo-argentino Heli-Sport CH-7.
No caso do R22-UV, a versão agrodrone é equipada ainda com um sistema de pulverização Simplex 222, com capacidade de 100 litros de calda e largura de faixa de 14 a 16 metros. O peso do equipamento é de 42 quilos e a autonomia em voo de aplicação é de duas horas.
No caso do Alpin, seu desenvolvimento ocorreu em parceria com a empresa de engenharia turca Titra e o R22-UV nasceu com a ajuda de um parceiro da Arábia Saudita, por isso eles já estão, respectivamente, certificados nesses países. Todos têm capacidade para voo noturno e em condições climáticas severas.
Entre as vantagens do helicóptero de operação remota sobre o drone de grande porte projetado do zero, Taisia enumera o menor custo operacional, maior facilidade em conseguir peças sobressalentes e maior facilidade em se ter uma aeronave de acordo com a carga útil necessária.
Cada setor com seu espaço
“Não há razão para tirar o piloto de dentro do avião. O caminho natural é trazer um pouco mais da automatização do drone para dentro do avião (como já ocorre em parte do sistema de pulverização), com novas tecnologias de precisão e tal.” A fala é do CEO da Voa Holdings Corporation, Nei Salis Brasil, deixando claro que aviões e drones são complementares nas lavouras. “Para mim, é ponto pacífico. Drones cumprem missões que não seriam boas para a aviação tradicional. Já onde o avião é competitivo, dificilmente o drone é competitivo. Não há como comparar um aparelho que carrega 10 a 30 litros com outro que carrega mil litros.”
E arremata: “A imagem do drone grande carregando 1 mil litros de produto ainda é muito especulativa, inviável economicamente na lavoura. Posso dizer isso porque trabalhávamos drones grandes para o setor de Defesa (Forças Armadas).”
No mais, ele aposta em um grande crescimento do setor no Brasil. “A demanda estabelecida já está maior do que a oferta. Então, enxergamos que há oportunidades para todo mundo.” A Voa foi fundada por Nei nos Estados Unidos, em junho de 2018, e por aqui atua através da Voa Tecnologia e Participações, em São Paulo. Apesar de fabricar os aparelhos, o foco dela não é a venda, e sim a operação em comodato com os operadores. A estes ela oferece também uma plataforma que facilita o contato com os agricultores que precisam do serviço (como uma espécie de Uber).
Toda a tecnologia da empresa vem sendo implantada primeiro no Brasil e agora é que ela se prepara para expandir nos Estados Unidos. “Escolhemos iniciar as operações no Brasil principalmente pela regulamentação. O País já tem regras estabelecidas e estamos operando desde novembro de 2019. Com a validação das tecnologias aqui, agora começamos a conquistar os primeiros clientes norte-americanos.”
Nas terras do Tio Sam, a empresa anglo-brasileira está apostando em culturas de alto valor agregado, como os vinhedos da Califórnia, além de batata, cebolas e outras lavouras da costa oeste do país e que exigem tratamento diferenciado. Segundo Nei, espaços onde a aviação agrícola não tem grande atuação e onde os drones podem ter um impacto positivo importante.
REGULAÇÃO
Falando em impacto positivo, Nei Salis se diz otimista com publicação da IN dos Drones pelo Ministério da Agricultura. “Se o órgão não resolver ‘pesar a mão’ no regramento e ele ficar dentro da realidade do setor”. O empresário explica que muitas empresas grandes ainda estão receosas de apostar na ferramenta justamente pela lacuna na legislação para seu uso em lavouras. “Se o Mapa conseguir equacionar as demandas, vai ser muito bom.”
Sobre a chamada aviação agrícola de precisão, a Voa já sente o aumento dessa tendência em campo. “De precisão, todo o serviço é, mas cada vez mais clientes têm consultado a empresa sobre aplicações localizadas dentro de áreas maiores. Tendência que não é exclusiva dos drones”, destaca, reforçando que em curto prazo o procedimento de aplicar só onde é necessário e na dose certa (com fluxo variável e a partir da análise de imagens multiespectrais) será a regra também para aviões.
Apesar de não descartar futuramente colocar no mercado aparelhos de imageamento, Nei lembra que a fonte também pode ser, por exemplo, satélites de baixas órbitas, “que já fornecem imagens com resolução muito boas”.
Sobre novidades, aliás, o empresário adianta que a Voa deve anunciar um lançamento ainda no primeiro semestre para o mercado. Sobre o que é, o empresário diz apenas se tratar de uma solução não tradicional, “mas que deixará muito claro que aviões e drones são ferramentas complementares e cada um com seu espaço”.
Equipamento democrático
O diretor da Schroder Consultoria (SC Agro), Eugênio Schröder, também aposta em grande crescimento do mercado de drones agrícolas no Brasil. “Não só porque o País é grande e tem muitos agricultores, mas também pela diversidade de culturas que há por aqui. Em contrapartida, o drone é o equipamento mais democrático que existe: pode atender tanto o pequeno produtor de eucalipto quanto o médio produtor de grãos. E até os grandes produtores, complementando as aplicações feitas por plataformas maiores, como tratores e aviões.”
Ele também aponta novas perspectivas de uso, como aplicação de sólidos. “Desde o ano passado estamos fazendo semeadura e adubação aérea.” Além de outro ponto forte que promete repetir o fenômeno da Ásia: a substituição aos pulverizadores costais. “Tira o operador de perto do produto na aplicação e não há mais ninguém na lavoura.” Sem falar que também por aqui pesa o fato do trabalho menos pesado e mais tecnificado ser atrativo para os jovens. Afinal, no Brasil a população também está envelhecendo no campo. “Com o drone, os filhos ficam.”
Apesar da vantagem da precisão nas lavouras, o empresário admite que o drone ainda é tecnologia cara. “Um aparelho completaço, com baterias para trabalhar tranquilo em campo, custa o preço de dois automóveis”, explica. Segundo ele, a tendência é baratear. “As baterias, por exemplo, estão o mesmo preço que há dois anos, mas estão mais eficientes.”
Porém o equipamento se torna atrativo pela economia dos produtos no trato das lavouras. “Os insumos representam grande parte do custo de produção e o agricultor faz essa conta. Em vez de aplicar (defensivos) em toda a lavoura, aplica-se somente nas manchas. A economia de produto paga o drone e sobra dinheiro”.
POLÍTICAS
Para o diretor da SkyDrones Tecnologia Aviônica, de Porto Alegre, Ulf Bogdawa, o setor ainda carece de uma política para essa tecnologia chegue mais rápido aos agricultores. Especialmente na parte de tributos, que são um entrave sério para sua massificação. “Na China, um produtor rural de 10 hectares consegue facilmente ter seu drone. Aqui o equipamento sai duas a três vezes mais caro para o agricultor”. Só o imposto de importação dos componentes custa mais de 30% e há a partir daí os tributos em cascata (entre a indústria que monta seus aparelhos e sua chegada no mercado).
Bogdawa explica que no Brasil não há fabricação de motores, baterias e nem das peças de fibra de carbono ou outros componentes. “Se tivéssemos pelo menos 60% de itens nacionais na montagem dos aparelhos, poderíamos, por exemplo contar com apoio da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos, do Ministério da Ciência e Tecnologia)”. Fabricar os drones no Brasil significa importar todos os componentes (inclusive boa parte dos eletrônicos). “Mas nós fazemos aqui a parte de firmware e software (programação). Ou seja, se o corpo vem de fora, conseguimos que a alma seja nossa”, completa.
Essa alma brasileira já faz a diferença para que os drones sejam melhor adaptados às demandas do País. Por exemplo, os aparelhos da SkyDrones já chegam ao mercado programados para gerar relatórios operacionais com as informações e no formato exigidos pelo Mapa para aviação agrícola – e que, a partir da IN dos Drones, serão obrigatórios também para os aparelhos não tripulados. “Um aparelho de software chinês não conseguiria fazer isso.”
Mercado não pode esperar
O consultor Eugênio Schröder também está entre os que acreditam que regulamentação dos drones agrícolas, prestes a ser publicada pelo Mapa, deve favorecer o setor. Porém, em alguns aspectos o mercado não pôde esperar. No caso da SC Agro e da SkyDrones/SkyAgri**, as empresas decidiram adiantar rotinas que em setembro (quando terminou a consulta pública da IN dos Drones) figuravam no texto provisório da medida.
Caso da formação de profissionais, onde as empresas parceiras formaram neste início de ano a décima turma, somando mais de 100 pilotos de drones treinados segundo requisitos até então provisórios de currículo. “São profissionais que estariam operando de qualquer maneira. Daí a opção foi por elevar a segurança das operações”, justifica Schröder. Além de garantir um padrão de qualidade da chamada Rededrones, plataforma pela qual as parceiras dão consultoria para novos empresários e intermediam a busca de clientes.
Outro fator foi a própria emissão de relatórios operacionais pelos drones da SkyDrones, informando produto aplicado, localização georreferenciada da propriedade atendida e traçado do voo, tipo de lavoura, condições climáticas e outros dados. Tudo pronto para “conversar” com o Sistema Integrado de Produtos e Estabelecimentos Agropecuários (Sipeagro) do Mapa. A plataforma está terminando os testes para digitalização do envio de relatórios tanto de drones quanto de operações da aviação agrícola convencional – que deve ser colocado em prática ainda no primeiro semestre.
Apesar de novidade para os drones, a digitalização do envio dos relatórios atende a uma demanda antiga do Sindag a partir dos aviões, que são obrigados a enviar essa documentação mensalmente desde 1989. Mas até então tudo em papel e com dados não processados pelo órgão, privando o setor de informações cruciais para elaborar políticas de médio e longo prazos.
(**) A SkyAgri é a spin-off agrícola da SkyDrones, fundada em 2008 e que por sua vez atua em diversos outros segmentos (inclusive considerada de importância estratégica pelo Ministério da Defesa). Além disso, a SkyDrones e foi provavelmente a primeira empresa do setor de aeronaves remotas no mundo a se associar a uma entidade aeroagrícola. No caso, o Sindag, em 2017.